Depois de tantos anos o velho Benedito pensava como seria no futuro, viveu sempre no mesmo povoado, nasceu, cresceu ali.
Subiu nas goiabeiras, nas jabuticabeiras, comeu as frutas no pé, nadou no riachinho lá no fundo da fazenda. Fez todas as peraltices como todo moleque travesso.
Sua mãe era uma senhora muito carinhosa e seu pai homem justo, de brio, muito sério e de poucas palavras, mas muito trabalhador. Ensinaram os filhos a ganhar o pão desde muito cedo, assim que tivessem tamanho para pegar numa enxada ia cedo pra roça, capinar café. Era assim que se formava homem de bem.
O velho Benedito gostava de contar os ‘’causos’’ de sua curta infância, pois cedo foi pra lida, e se casou muito jovem, com uma moça de boa família, que morava na fazenda vizinha, como era o costume.
Teve poucos filhos o que não era normal naquela época, mas sua esposa uma cabocla muito bonita tinha uma saúde muito frágil, lhe deu só três filhos sendo: dois homens e uma mulher, que era a caçula.
Normalmente as famílias naquela época eram grandes, os casais tinham em média dez filhos, em pouco tempo a criançada tava pronta pra pegar na enxada, mão de obra barata e fiel pra ajudar nas extensas plantações das grandes fazendas, o que mais importava era comprar terras, quanto mais, melhor, assim se media as posses de um fazendeiro, pelo tamanho de suas terras.
E foi assim que ele viveu, o tempo passou lento, seus filhos cresceram, casaram como sempre acontecia, sem novidades, ficou viúvo, sofreu muito com a perda de sua estimada companheira, esposa fiel, mulher de fibra sempre lutou ao seu lado para criar os filhos, assim foi por muitos anos, mas derrepente percebeu que estava só, a idade avançando, os filhos casando cuidando de suas próprias famílias, essa é a lei da natureza, como gostava de dizer: ninguém fica pra semente.
Tinha um consolo, os netos vinham em abundancia, diferentes dele seus filhos tiveram muitos filhos, e desses filhos vinham outros filhos, mas ele preferia morar só na casa grande da fazenda.
Com o tempo velho Benedito já não podia ir pra roça, mas as terras que comprara com o suor de seu rosto e de sua esposa, eram muito grande, sempre teve tino pra negociar as produções da lavoura e seus filhos como ele havia ensinado bem, cada um tinha já o seu quinhão de terra, para laborar, a idade havia chegado, e seu corpo cansado de tanta luta, já reclamava um descanso bem merecido.
Terra roxa, terra de café, era assim a fazenda inteira, a idéia de vender, tirava o sono daquele homem, depois de tanta luta, não podia mais capinar, arar, roçar, não tinha solução, iria vender parte da fazenda, pois as terras tinham de ser cultivadas, se não por ele que fosse por outro lavrador.
Os filhos estavam de acordo, o velho pai precisava descansar com tranqüilidade.
Eles só não sabiam o que o velho já era homem rico, pois ele guardara algum dinheiro, para o caso de alguma precisão, e nada dissera aos filhos, pois cada um tomou um rumo e se fizeram por conta própria, as terras dos filhos não era tão grande como a fazenda do velho Benedito, mas já era o suficiente para criar os filhos, tava bom assim, enricá pra que?
Um dia um fazendeiro vizinho teve um problema sério, precisava de dinheiro com urgência, o banco estava preste a tomar sua fazenda quando o velho Benedito vendo a aflição do amigo, sabendo que foi só uma safra ruim e que o homem era honesto, acudiu o fazendeiro, emprestou uma quantia em dinheiro que estava guardada no banco.
Salvou as terras do vizinho, este muito agradecido lhe pagou os mesmo juros que o banco cobraria, vendo ai uma vantagem o velho Benedito, se tornou o banqueiro informal da região, emprestando dinheiro a juros para os agricultores, que lhe pagavam religiosamente, sem ter o incomodo de ir até a cidade para guardar o dinheiro. Ficou cômodo para o velho Benedito, era como chamavam o fazendeiro.
Um de seus filhos não era muito feliz no casamento, sua esposa era muito voluntariosa, lhe dera onze filhos dos quais só dois era mulher o resto tudo homem para trabalhar na roça, mas depois de muitos anos, ela achou que deveria haver mais do que só cuidar dos filhos, da casa, das criações e das plantações, resolveu tomar as rédeas da família, naquela casa, agora quem mandava era ela, e nos finais de semana começou ir para os bailes se divertir, adorava dançar, tomou gosto pela liberdade e nos fins de semana saia e só chegava a casa quando era madrugada alta, com seu belíssimo cavalo branco, que ela comprou só para ir os bailes, na volta o marido cuidava do animal a mando da esposa.
Montava muito bem a bela senhora, moça de fazenda conhecia bem um bom animal.
O velho Benedito nunca aceitou essa situação, pra ele quem devia vestir as calças, ser macho naquela casa era seu filho, mas coitado, esse pouca autoridade tinha com aquela mulher, que todos na região já chamavam de “mulher-macho”, com o tempo ela passou a comprar, vender, domar cavalo, mandava mesmo, ao marido só restava acatar, ou dormiria no paiol.
E era muito brava, pra cuidar e educar um bando de moleques teve que ser dura, ninguém se metia com ela, nos bailes ela tirava o caboclo pra contra dança, e ai do sujeito que recusasse, era uma mulher muito alta e forte, pra surrar um caboclo não precisava muito, e também gostava de tomar uns goles a mais.
Com o velho Benedito ela não se metia, na verdade tinha esperança de herdar do velho a fortuna que ele amealhava, ela dizia pertenceria ao marido, quando o velho batesse as botas, pois o esposo era o primogênito, embora não tivesse a menor idéia de quanto era essa fortuna ela sonhava com esse dinheiro, e o velho não andava bem de saúde, era questão de tempo.
Mal sabia ela que o velho, também já havia pensado nisso, sabia da “gana” da nora agourenta e se precavera para no caso em que viesse a bater com as botas ela não poria as mãos em nenhum tostão, do seu dinheiro. Seu filho escolhera mal a mulher pra casar, azar dele.
Velho Benedito viveu seus dias de velhice com tranqüilidade, seus netos, lhe davam muita alegria, foi um avô maravilhoso, sempre rodeado por crianças, uns mandados pelos pais, caso ele fosse deixar uma herança, se lembraria desse, mas a maioria era pelo prazer de sua companhia mesmo, suas deliciosas história contadas ao pé do fogão de lenha, onde se empoleirava, para se aquecer nas frias tardes de inverno.
Mas como ninguém fica pra semente, o velho Benedito também não ficou, se foi calmamente numa noite quente de verão, partiu sem se despedir, restava as histórias que seus filhos, depois os netos levariam para sempre na lembrança, iriam se lembrar com saudade daquele, avô carinhoso e cheio de “causos”.
Pois bem, mas e agora? como ficou a tal herança? Para quem ele deixou toda sua fortuna, já que os filhos praticamente abandonaram o velho ali? As visitas que recebia, ou era as crianças, para ouvir as histórias, ou era os clientes emprestando dinheiro, ou pagando empréstimos, a família dizia não ter tempo, para fazer visitas, muita lida no campo.
Agora não precisavam estar ali, a casa estava vazia, silenciosa, as terras ele havia vendido quase toda, pouco restou da enorme fazenda, as galinhas no terreiro, pareciam entender o que acontecera, derrepente aquela cozinha aconchegante, deixou de existir, ninguém se lembrou de acender o fogão, estava tudo frio, meio sombrio até, as crianças estavam sentindo de verdade a perda do avô, mas só elas, porque os adultos só queriam saber de uma coisa. Onde estava o dinheiro?
Depois de enterrar o velho ao lado de sua querida esposa, não demorou muito e começou uma verdadeira corrida ao ouro, não foi pouco o que reviraram a casa, tudo foi retirado do lugar não ficou pedra sobre pedra, e nada, a fortuna tinha sumido, desapareceu da face da terra, derrepente alguém teve a infeliz idéia de ver se ele havia escondido debaixo do assoalho do quarto, em pouco tempo apareceu pás e picaretas e os buracos foram aberto, e ainda nada, decidiram botar a casa abaixo, fizeram isso e nada encontraram, nem um mísero tostão apareceu, o próximo passo foi escavar o quintal, no final das contas tudo o que restou da fazendinha, foi uma área esburacada e o terreno todo revirado e o tesouro nunca foi encontrado.
A nora valentona ficou furiosa com o velho que se atreveu partir, sem deixar a herança de seu esposo, falou mal, esbravejou, mas teve de se conformar.
Na região ninguém sabia como foi que o velho fez para nada deixar, será que ele gastou tudo o que tinha? Mas gastou com o que?Como?
Era a pergunta que todos se faziam e a resposta era sempre a mesma, nada.
O tempo passou e o mistério continua até hoje, o que aconteceu com a fortuna do velho Benedito?. Sem resposta.
Nilda Zafra

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